Bob Dylan - New Morning (1970)

Em 1970, Bob Dylan estava numa fase extremamente relaxada. Depois de sua fase folk (de 1962 a 1964), elétrica (de 1965 a 1966), de John Wesley Harding (1967) e Nashville Skyline (1969), o compositor parecia estar confiante no seu trabalho e sem maiores pretensões em ser revolucionário ou passar mensagens importantes em suas letras. Dylan queria fazer um tipo de música sincera e que transmitisse o que estava sentindo no momento.

A abertura não poderia ser melhor, com a doce e acústica “If Not For You”, regravada pouco tempo depois por George Harrison. Romântica? Sim. Brega? Jamais. Dylan fala de amor como Chico Buarque, de forma poética e revelando várias nuances de seu lirismo. Não são bobas canções de amor simplesmente, mas sim contemplações da alma feminina.

“Went to See the Gipsy” começa com um pianinho gostoso, seguido da voz áspera (e agradável) de Dylan. Tem um ritmo interessante e letra curiosa, falando de um cigano. A guitarrinha no final é sensacional, dando um toque especial na conclusão da canção.

“Winterlude” é uma modinha melódica que mais parece uma canção do início da carreira de Elvis Presley. Não é melosa, mas tem um toque retrô, como “Piggies”, dos Beatles, e “Oh, Meu Imenso Amor”, de Roberto Carlos. A poética permanece afiada, em passagens como “The snow is so cold, but our love can be bold, Winterlude, don’t be rude, please be mine”.

“New Morning” é o ponto mais alto do disco, onde o compositor se mostra ainda capaz de fazer hits ao estilo de “Lay Lady Lay”, de seu álbum anterior. É uma canção esperançosa, que fala de uma “nova manhã”, onde o eu-lírico fica feliz só de ver sua companheira sorrir, um gesto tão simples e bonito. E é assim a poesia de Dylan: consegue transformar coisas banais em extremamente apreciáveis. Coisa de gênio.

Para fechar a obra, temos a rápida “Father of Night”, que tem backing vocals femininos, como aqueles de canções gospel americanas dos anos 50. Dylan parece fazer uma ode à criação de tudo, antecipando sua futura fase teísta. A canção termina a grande viagem musical que é esse disco e que, com certeza, encontra-se entre os melhores de Dylan.